Quase que já considero cliché falar da crise. Principalmente porque muita gente fala mas apenas com base no mundo que conhece. Como me relaciono com pessoas de vários mundinhos ouço queixas relativamente a ter de trabalhar dezasseis horas em dois dias (!), de ter de escolher entre aulas de equitação ou de piano ou de começar a cultivar umas verduras no próprio jardim. Claro que todos somos afectados pela crise (todos, todos não seremos...) mas já deu para perceber que uns são mais afectados que outros.
Quando nos habituamos a um determinado nível de vida é-nos difícil abandoná-lo. Agora imaginem quando esse nível de vida já não era aguentado. É que apesar de conhecer vários mundinho apercebi-me de uma coisa: a maior parte vive ou vivia acima das suas posses. Esse é o primeiro erro. Queremos as coisas e pensamos em como as pagar depois. Um conselho: pagar primeiro e usar depois.
Há ainda outra coisa que me faz uma tremenda confusão: se estamos a precisar de tantas medidas de austeridade porque não começar a fazer essas medidas para todos? E ainda melhor: para todos aqueles a quem a crise não chegou. É que se vê que os grandes senhores estão cada vez melhor enquanto há muita gente a ter apenas uma refeição por dia.
O nosso Sócrates, que é um amor de pessoa e que tem tanta gente que gosta dele (parabéns a quem voltou a votar nele, graças a vocês continuamos na mesma!), diz que não consegue compreender aqueles que dizem "eu não sei nem apresento medidas alternativas". Olhe Senhor Engenheiro: "Eu não sei, mas se quiser apresento-lhe umas medidas alternativas", a começar por averiguar os argumentos daqueles que convenceram a manter o golfe a com 6% de IVA e passando, também, por averiguar os tais 72.000,00€ de suplemento remuneratório à procuradora-adjunta que por acaso é mulher do Senhor Ministro da Justiça e mais umas coisinhas que se vão vendo.
Lá está: a crise no mundinho destes senhores é diferente da crise do meu mundinho... Quando a crise estiver igual para todos, aí sim: todos terão moral para falar...